VINHO, HOMEOSTASIA, CATARSE E HARMONIA.

Como Lasviniano irredento nas terras do Norte, fum nomeado no anterior encontro pelo Prof. D. Antonio Tenreiro, para apresentar um escrito sobre “Vinho, Harmonia e Concerto Pitagórico”, baseado numa frase de Valle Inclan, e estas presentes aportações tentam ser uma prolongação daquelas reflexões.

Primeiramente e polo princípio, uma questão de ordem de prioridades. Disciplinado e obediente, “in anima” sempre fum discrepante com o nome. As duvidas continuadas e angústia noturna que me impede dormir, cavilando e meditando sobre as siglas, o lema e motto da nossa Bem querida e Respeitada Associação. Que e mais importante a saúde ou o vinho? Porque a nutrição e obvia, justa, necessária, mas, ¿Qual deve ser a nossa ordem de prioridades?

Sendo apolínea, está correta com as siglas atuais, LASVIN, mas os dionisíacos estaríamos melhor priorizando o vinho e o acrônimo proposto seria então “LAVISAN”, Liga do Vinho, a Saúde e a Nutrição”. 

E justifico a minha tese com o provérbio latino “Primum bebere, deinde philosophare…”e o aforismo da minha tuna universitária “ Se o vinho e as mulheres prejudicam os teus estudos e negócios…deixa os estudos e negócios”. 


Ou seja, aponto-me como dionisíaco, mas acato disciplinadamente a decisão democrática ponderada. Nestas metafísicas questões nom pode valer o voto de um abstêmio, "o hipo de um bêbedo ou o rezo de um hipócrita". 

Constando em ata a minha duvida metódica, passo a partilhar com Va. Exas. as minhas reflexões, pensamentos, e algumas conclusões, que o vinho fai aflorar.


HOMEOSTASIA

O Homem e um equilibro continuado, dinâmico, auto-regulado e controlado principalmente pelo hipotálamo, cambiante e modificado, e ajusta-se constantemente segundo os estímulos e informações que recebe. 

Por isso a saúde também nom só e um “Estado de Bem-estar físico, mental e social, e nom só a ausência de enfermidade”, segundo a definição da OMS. Nom só “o silêncio dos órgãos”, senão mais bem um “Processo continuado”, “um filme mais do que uma fotografia”, pois funciona em relação ao tempo e nunca estaria completa, nem seria total. Um vinho dito “biodinâmico” seria uma redundância, pois o vinho é um ser vivo.

E há uma relação homeostática, tanto individual como social, entre o que come e bebe um individuo e o que se é, o que se deseja ser, e o que os alimentos e bebidas permitem e fazem ser. 

Muito se tem falado das capacidades medicinais do vinho em relação com as propriedades curativas fisiológicas. Já temos avançado com o descobrimento experimental da curva em “J” e tudos estamos a favor da cultura do vinho, em contraposição com a barbárie do Álcool. E a ciência, consiste ás vezes em registrar, demonstrar cientificamente o que estava na tradição e sabedoria dos velhos, as experiências acumuladas, mas não sabíamos por quê e quanto, até de que forma e como podemos fazê-lo melhor. 

Isso é o que aconteceu quando os cientistas de todo o mundo descobriram que os povos que tinham o vinho nas suas dietas, viviam mais tempo, e com mais ausência de enfermidades que os dous países mais ricos, que tenham uma dieta mais rica em gorduras e um regime de vida mais estressado.Todos já o sabíamos empiricamente, eram conhecimentos que se transmitiam entre pais-filhos-netos nas catacumbas das adegas.

Os investigadores de todo o mundo, nomeadamente o Dr. Jack Masquelier, em Burdeos estavam comprovando os efeitos positivos do vinho na saúde, e registrando os seus dados. Mas o dinamizador fenômeno de ser difundidas e noticiadas estas investigações na CBS televisão nos USA, desencadeou o mito e a fúria do “French Paradox” levando, nessas ondas de moda, o vinho à categoria próxima a “Health Food”, Nutracetico.

Desde então ate agora, muito se tem adiantado e demonstrado e temos seguido, alentado e admirado os trabalhos de numerosos cientistas, alguns aqui presentes, aos quais vai a minha homenagem. 



Esta e a minha tese

Acho que temos adiantado mais nos estudos dos efeitos físicos, mais na parte Fisiológica que na parte Anímica, Espiritual, e a Holística, a qualidade de vida, ainda que todas elas som complementárias e inter-relacionadas.

Temos um continuado caminho de investigações por diante e a minha proposta e também estudar, aprofundar nos efeitos beneficiosos do vinho na gana, desejo, alegria de viver, otimismo, mesmo para enfrentar os claros olhos da morte, sentência final. O homem que pode dizer “Morrerei tranqüilo, quando rematar este copo…”. 

Esta é uma outra linha de defesa, pois o desafio na vida do homem e múltipla, não só consiste em viver mais tempo, senão em viver melhor, longevidade com melhor qualidade de vida, e sentir-se útil, apreciado, respeitado, satisfeito e manter a auto-estima até aos seus últimos dias.

E nisto ajuda, pode e deve ajudar o vinho, pois é um psicofármacos contra a pesadume, a frialdade dos muitos anos, contra a accidia ou “taedium cordis”, ou tédio existencial, o cancro da alma, o aborrecimento ou fastio.


CATARSE

“Vinum et Mulieris Laetificat Cor Homini”, ainda que, segundo a minha triste experiência, os dous sujeitos segundo as quantidades e as qualidades, produzem dor de cabeça. 

“Bonus semel síngulis mesibus inebriari”, Horacio dixit e ninguém o rebata se não estar ordenado de Teólogo!.

Dentro da farmacopea, deveríamos ser clássicos, sobretudo em relação sensibilidade e fragilidade da idade, com uma bebida e panacéia “clássica”, segura, experimentada por dezenas de séculos. E amparo-me em toda a tradição do vinho como medicina, ao longo da história, começado com Hipócrates e o seu hipocrás.

Permitide-me uma pergunta metafísica que é quase uma adivinha: “O vinho e o leite dos velhos ou o Leite e o vinho dos Velhos?”. Tenho um amigo que conta coisas do seu pai de 86 anos, que muito me fizerom reflexionar. Resulta que pegou no costume de ir várias noites por semana, falar, contar as suas penas, alegrias e beber uns copos a um clube, bar de senhoritas, mais conhecido como “Puticlube” para nos entender, com grave escândalo da família.

E também tem o hábito desde jovem de beber dous ou três copos de vinho ao mediodia e outros tantos ou algo mais, ao atardecer. O seu filho, e o seu gerontólogo andam, para mim, a estragar-lhe a vida, pois não encontra bom este regime. 

Eu estou a meditar, e acho que o falar, outra cousa e difícil a essa idade, com as moças e compartir a sua alegria e juventude, e uma forma de catarse, purga das emoções, que rejuvenesce o indivíduo, e cumpre o velho principio de “Alegria compartida aumenta, tristeza compartida, diminui”. É a pratica de descarregar culpas, pesares, angustias, insatisfações e pecados, do antigo confessionário, cheio de remordimentos, lavados pela água benta. E “comprar simpática companhia”, uma forma, um jeito moderno de diminuir a soledade da velhice, que como bem dizia o Papa Johan XXIII, é o maior problema do mundo moderno.

E por outra parte a mudança de medicina tradicional, clássica, representada pela costumada dose de vinho, que agora o médico quer-lhe substituir por Trankimazin, Alprazolan, Alcalóides e outras drogas e pílulas, mais ou menos estupefacientes, embotantes.

Nom sei como defender o pobre velho contra a moderna medicina, fazer ver que a antiga e tradicional dieta que levou até agora, tem demonstrado a sua bondade, já que o fez chegar aos 86 anos. E atrevidamente dizer-lhe ao seu filho e o seu medico que para uns cem ou douscentos anos mais que vai viver, que o deixem em paz, gastando o seu dinheiro a gosto, e bebendo o seu vinho, o vinho que ele próprio produziu das suas vinhas, que cultivava com as suas maos nas suas terras, e cuidava e mimava mais do que seu próprio corpo, pois ia formar parte dele. “Primum nom nocere…”

“A Juventude é a ebriedade sem vinho.
Mais si com ele recupera-se a juventude
Beber será para o velho uma virtude” 

Goethe

HARMONIA

Voltando a Hipócrates, a saúde era a “Isonomia”, ou harmonia, equilibro entre os líquidos ou humores do Sangue, a Flema, a Cólera e a bílis negra, a melankolía. Os gregos identificavam a saúde como “o perfeito equilibro”, e a pesar de procurá-la continuadamente em todas as expressões, também calculadamente a rompiam, usando precisamente as práticas dionisíacas de “Catharsis” pelo Teatro e a borracheira. 

A Raçóm e a lógica só os acompanhavam na primeira parte da viagem, mas eles procuravam o fim último a “sagrada essência das coisas”, o lado oculto do saber, o sentimento, o instinto.

Tanto nos ritos iniciáticos de Eleusis, nas suas orgias látrias, nos Sympossium, ou nos seus Oráculos embriagados, quebravam metódica e sistematicamente a apolínea harmonia, o equilibro, para conseguir o conhecimento pleno. 

A vida é “Agon”, lutas internas e externas, movimento, mudança, em contraposição a Morte que seria quietude e petrificação. Uma atitude biodinâmica seria de maior atividade, e nada tem a ver com a complacência, ou a felicidade, que podem mesmo fazer cair na Ataraxia grega, Zen oriental ou Nirvana Hindu.



Postos a escolher há países com um grande pudor como os Russos, que se declaram em luta com a Felicidade, antes que cair na estúpida felicidade obrigatória dos Norte-americanos, mesmo reconhecida na sua Constituição. Para um russo, o estado ideal e lógico e bêbedo ou triste, ou as duas coisas, enquanto os galaico-portugueses seriamos lírico-melancólico-nostálgicos, os andaluzes bulhangueiros, os italianos cantarins e os alemães, polícias. E os vinhos seriam como em cada pais, como elementos “psicofármacos”, para recortar ou aprofundar as crestas e vales, irregularidades ou desequilíbrios da gráfica homeostática. 

Encontríamos, nos vinhos vários aspectos de Harmonia:

1.-Com eles mesmos, conseqüentes com sua historia, tradição, entorno, idade, identidade.

2.-A bebida com a comida, os alimentos e o vinho, toda uma religião de casamentos afortunados de carnes, peixe, foie-gras, queijos, doces, etc. E mesmo como ingredientes ou molhos, incorporados.

3.-Com o lugar e entorno de consumo, numa adega, restaurante, fogar, taberna, pizzería de plástico e néon, avião ou Palácio histórico sugestionados polo peso dos séculos, etc.

4.-Com a hora do dia e o tempo do ano, vinhos matutinos ou vespertinos, crepusculares (“Era Porto e atardecía”, Eça de Queiroz), ligeiros de verão ou quentes de inverno.

5.-Em quê vasilha, recipiente, fino copo de cristal ou taça de barro, móveis, mantelería, temperatura,etc.

6.-Em quê companhia, confraternais amigos partilhando alegrias, na juventude ou um escolhido seleto grupo na veterania, com uma digestão prazenteira “Em boa companhia…”, preconiza o inteligente motto, lema da “Panela ao Lume”.

Poderíamos continuar “ad infinitum”, como os advérbios circunstanciais, compaginando harmonicamente com a quantidade e qualidade dos vinhos, mais concluíamos já, si o “Homem é a medida de todas as coisas”, e assim como os homens classificamos o vinho, também ele toma medida, classifica, identifica, categoriza ao bebedor que o bebe. 

Voltando aos gregos, pois cada vez que um ocidental tenta filosofar, encontra que já vem de volta um grego. Tinham os gregos umha jarra para cada um dos comensais ao Sympossium, com um buraco ou sinal a determinada altura para cada um. Si bebiam por acima da marca ficavam Ébrios, e por abaixo do sinal, sóbrios. Era uma sinal movível, circunstancial segundo tipo de festa e de vinho, e o estilo era viver “a grega”, “grecitavam”, uma “Sóbria Ebrietas” que o facultava para gozar do “Enthousiasmus”, sem cair em asneiras. Nom esqueçamos nunca que:

“Beber es todo medida
Alegrar el corazón
Y sin perder la razón
Darle razón a la vida”.

Amigos, Companheiros neste curto caminho que é a vida, brindemos por ela... ¡Sursum corda!...

José Posada
(Guisseppe Paussatta)
o seu Secretário Perpétuo